Todas as coisas me são lícitas; mas nem
todas as coisas convêm; todas as coisas me são lícitas; mas eu não me deixarei
dominar por nenhuma. - 1 Coríntios 6:12
Quando o homem
perde o controle do seu corpo quem padece não é apenas a sua alma, mas tudo que está ao seu
redor. Valdécio Rodrigues das Neves, 54 anos, viveu por muitos anos sob o
domínio do vício no corpo e, por conseguinte, do vício em sua alma. Pelo álcool
se divertia, mas também pelo álcool perdia tudo que tinha
valor em sua vida, a começar pelo que lhe era mais caro: a sua família.
Homem simples,
pai de um casal de filhos (ela, uma matemática; ele, aluno do fundamental), tinha terminado o ensino médio, em
2007, no Centro de Educação de
Jovens e Adultos Professor Alfredo
Simonetti. De lá para cá, embora a vontade fosse grande, o vício e as más
companhias lhe impediam de dar
continuidade ao seu sonho de ser,
um dia, um homem do Direito.
Um dia, depois
de se separar da sua mulher, ele acordou para o futuro. Repensou a sua vida,
refletiu sobre as suas amizades, olhou para o horizonte e chegou à conclusão de que a ilusão de uma
vida próspera, cheia de coisas boas, que o álcool lhe proporcionava, era
somente enquanto estava sob o seu efeito. Depois que esse passava era preciso recomeçar
tudo outra vez.
Desta forma,
sabendo que o futuro passa, principalmente, pela determinação, pela força de
vontade e pela compreensão e ajuda dos seus, ele tomou uma decisão: deixaria de
beber. E assim o fez. Marcou uma data para isso: final
do campeonato brasileiro de 2009. O seu time, o Flamengo, ia disputar o título. Seria,
portanto, ganhando ou perdendo, que ele poria bebida em sua boca. O seu time
venceu. Ele bebeu. Depois parou. O dia: 08/12/2009.
Durante o
doloroso processo de abstinência, ele tentou o grupo dos Alcoólicos Anônimos por um tempo, mas
viu que teria de ser mais radical se quisesse recuperar a dignidade, o respeito dos seus
familiares e dos verdadeiros amigos. Desta forma, decidiu por se internar. O
São Camilo foi a sua casa de recuperação.
Em seu
depoimento, ele conta que a Clínica foi a sua grande aliada na luta contra o
vício: “sem a ajuda de seus profissionais, eu não teria conseguido. Não é
fácil. Só com muita força, determinação e fé é possível superar os traumas
causados pela ação devastadora, no organismo, da bebida alcoólica”, disse ele
ainda comovido depois de tantos anos.
Superado o
problema com o álcool, recomeçar, retomar a sua vida era o passo seguinte. Para
isso ele procurou alguém que lhe fizesse companhia e lhe ajudasse nos momentos
de fraqueza. Achou. Depois disso ele exercitou a sua profissão primeira: torneiro mecânico.
O segundo
passo foi uma tentativa de voltar a estudar. Para isso, em 2010, ele começou a ler, esporadicamente,
alguns livros didáticos. Precisava se acostumar aos novos “vícios”, esses, sem
sombra de dúvida, bem mais salutares que
os anteriores.
Feito isso, em
2013, entrou para o Cursinho da
12ª DIRED. Normalmente, não poderia entrar (só frequentam o cursinho alunos oriundos das escolas públicas estaduais da
circunscrição da 12ª DIRED e que estejam fazendo o último ano do ensino médio e,
ainda, que tenham boas notas, ótimo comportamento, prezem pela assiduidade e
desejem, de fato, superar todos os obstáculos que a concorrência lhes impõe na
luta por uma colocação na Universidade), mas a diretora e a coordenadora do
cursinho, sensibilizadas pela sua história de vida e superação, abriram uma
exceção.
Fizeram bem.
Ele se tornou um exemplo para os mais jovens e sua força e seu otimismo
influenciam àqueles que estão
desanimados. Na sala do cursinho, é conhecido por “tio”. O caminho percorrido,
todos os sábados, é sempre o mesmo e sempre a pé: Barrocas II – ida e volta. A
cabeça branca destoa das cabeleiras dos seus colegas de menos de 18 anos. Mas
isso não é problema. Ele sabe que o conhecimento não tem prazo de validade e a
idade para aprender não se limita aos anos de juventude. Porém, tem que estudar
mais, querer mais, esforçar-se mais
para conseguir. E ele quer.
Das lições
aprendidas, uma lhe serve como um mantra e, invariavelmente, ele a repete: o
álcool destrói a sua família, atrai falsas amizades e, no final, você acaba
perdendo respeito, honra e dignidade.
Com relação ao
cursinho, ele disse que o cursinho ajuda muito no reforço, que tem excelentes
professores, material de primeira qualidade e o que lhe resta, de fato, é
estudar.
Por fim, ele falou
que o convívio entre os jovens do cursinho lhe trouxe motivação e esperança de
que, agora no ENEM, ele finalmente consiga uma vaga para o tão sonhado curso de
graduação: Direito.
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